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Depp deixa de lado as caricaturas e mergulha no mundo pós-Depressão, mas roteiro de Michael Mann é confuso e pouco carismático.

Não é de hoje que Hollywood adora idolatrar os grandes “heróis” da cultura norte-americana. Os pistoleiros do Velho Oeste estão entre os assuntos prediletos, mas ninguém tira o charme e glamour dos gangsters das décadas de 20 e 30. Um desses ídolos improváveis é John Dillinger, um dos maiores assaltantes a banco da história, classificado como Inimigo Público, nome que acompanha o mais recente filme de Michael Mann. Para realizar essa cinebiografia, Mann escalou Johnny Depp, fora de seu elemento caricato, mas nem a presença de um dos rostos mais conhecidos da atualidade deu personalidade a um filme desalmado. Claro, todo filmado em HD.

Os personagens são emblemáticos. Dillinger inspirou Hollywood mesmo em vida, sendo retratado em tela em diversos filmes. Assistiu a um desses filmes pouco antes de ser morto pela força tarefa comandada por Melvin Purvis (Christian Bale), um policial modelo, mas muito menos famoso que seu alvo. Assim como Edgar Hoover (Billy Crudup), figura egoísta e fundamental na história do FBI – ele foi pai da instituição. Mas suas histórias são apenas peças na trama de Michael Mann e baseada no livro Brian Burrough.

É praticamente impossível captar todos os motivos que fizeram de Dillinger uma figura carismática e adorada pelo público – para quem fazia as vezes de Robin Hood contemporâneo. Tão dedicado a sua ocupação, quanto a sua paixão por Billie (vivida pela vendedora do Oscar Marion Cotillard), Dillinger enfrenta um futuro incerto, ou melhor, um presente duvidoso. O mesmo vale para Michael Mann. Preocupado em inserir o maior número de informações verídicas nessa cinebiografia, não escolheu um lado no duelo. Torcer para Dillinger e sua paixão ou ser cativado por Purvis, um paladino idealista em meio a uma polícia que procura redenção, profissionalização e ética?

Os dilemas dos personagens não convencem. Conhecer a história de Dillinger ajuda a ter empatia pelo sujeito, mas nem Johnny Depp foi capaz de superar a edição. Demorada e artística em alguns momentos, caótica e desinteressante em outros, a seqüência de idéias fica devendo. Por não escolher lados, o encadeamento não só fica em cima do muro, mas também cai, como Humpty Dumpty. E uma queda dessas em HD é mais complicada.

Mann credita essa situação à quantidade gigantesca de informação disponível sobre Dillinger. “São tantas facetas, situações e níveis de entendimento sobre ele que juntar tudo seria impossível”, explicou ao SOS Hollywood. “Precisava mostrar os motivos por trás das decisões dele, seu modo de encarar a vida e acreditar que sempre escaparia”. Entretanto, essa responsabilidade caiu única e exclusivamente sobre as costas de Depp. Tem momentos sublimes, como seu passeio dentro do escritório da unidade que o caçava; e seu embate com sua versão cinematográfica, na pele de Clark Gable, em Vencido Pela Lei.

Inimigos Públicos é indeciso. Faltou a Mann optar por romancear ou partir para o documentário assumido. Não ofende o espectador, mas fica muito aquém do esperado. Exceto por Depp, pouco se lembra da extensa projeção. “Filmes são apenas filmes, às vezes se espera muito deles e isso está errado”, finaliza Mann. Não é assim que os departamentos de marketing pensam. No modelo atual, todo filme é o “melhor filme do ano” e coitado do espectador, que nunca sabe em quem confiar. Cada vez mais, o espírito deve ser: vá ao cinema por sua conta e risco. Não há crítica ou marketing melhor.

Fábio M. Barreto

Fábio M. Barreto

Fábio M. Barreto novelista de ficção, roteirista e diretor de cinema e TV. Atuou como criador de conteúdo multimídia, mentor literário e é escritor premiado e com vários bestsellers na Amazon. Criador do podcast "Gente Que Escreve" e da plataforma EscrevaSuaHistoria.net.
Atualmente, vive em Brasília com a família.

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19 Comments

  1. Em um ano até que fraco para grandes lançamentos, esse era um dos filmes que eu mais esperava, vou procurar assistir, mas vacinado para não esperar grande coisa, o que possibilita uma melhor sensação de não ter o seu dinheiro jogado fora, o que eu acredito seja o papel do crítico de cinema, gerar expectativas ou tira-las, possibilitando ao espectador uma melhor inserção na película.

    1. Fala João, gosto tanto mais de filmes dos quais não espero nada. Vivemos um momento problemático, os filmes em si não são mais responsáveis por nossas reações. Tá cada vez mais difícil entrar numa sala totalmente aberto a uma experiência. Preferia antigamente, quando decidia o que assistir na frente da bilheteria. 🙂

      abs,
      Fábio

  2. Sou fã de Johnny Deep e o nome dele associado á algum filme já me motiva a assistir.
    Acho que você está com razão ao dizer que não devemos confiar sempre na divulgação e sua crítica gera mais expectativa.
    Irei, como sempre, por minha conta e risco pra ver se gosto ou não do filme porque do Deep gosto sempre!

    1. Oi Marcia, o Depp vale a pena sim. Tem momentos ótimos. =D

  3. Assisti e realmente cai do cavalo…
    A unica coisa que realmente me motivou foi a cena de tiroteios a noite…
    Mesmo assim um filme não é só isso e no resto ele peca, e muito.

    1. Natalia, adorei ele passeando pelas delegacias e mostrando como os policiais eram tapados naquela época. :p =D

      bj,
      Fabio

  4. “Filmes são apenas filmes, às vezes se espera muito deles e isso está errado”, finaliza Mann.

    Michael Mann conseguiu resumir bem o que tem acontecido com muitos filmes. Cria-se uma espectativa tão grande que o filme acaba ficando abaixo do que que esperavamos.

    1. Wag, ele pode ter pontuado bem, mas na mesma entrevista, ele se leva bastante a sério. Fiquei na dúvida se “filme deve ser apenas um filme” por eu ter acabado de criticá-lo abertamente na coletiva, ou por algo que Mann realmente acredite. Sempre existem os dois lados.
      🙂

  5. Gosta de filmes de Gangster? Confira crítica de "Inimigos Públicos", no SOS Hollywood! http://bit.ly/EV0Fi

  6. RT @soshollywood: Gosta de filmes de Gangster? Confira crítica de "Inimigos Públicos", no SOS Hollywood! http://bit.ly/EV0Fi

  7. Achei um filme legal, razoável, até meio arrastado. O destaque na minha opinião é a dupla de protagonistas. Christian Bale fez um bom trabalho, tentando até imitar o modo de falar de Purvis e Depp fez um grande trabalho como Dillinger. A melhor sequência sem dúvidas é a parte onde ele assiste o filme e é morto ao sair. Direção e edição muito boas nessa parte. Nota 6.

  8. […] Barreto SOS HOLLYWOOD “Inimigos Públicos é indeciso. Faltou a Michael Mann optar por romancear ou partir para o […]

  9. Barreto, vou assistir esse filme amanhan, pra ver se os chitas do jonny depp tem razão em dizer q ele nesse papel esta com uma atuação fantastica.
    Mas em um todo o filme é fraco ou so se destaca por esta atuação.
    Mau Saldanha achou sem graça, e disse q até op proprio Bale ainda leva mais credito q o depp.

    1. Will, o filme é fraco sim.
      Gosto do Depp, mas concordo quando se diz que ele tem momentos ruins. Todo ator tem, mesmo os grandes. Acho que ele está tranquilo em Inimigos Públicos, mas nada grandioso. Amigos críticos rasgaram uma seda danada. Não concordo. Adorar o ator é uma coisa, analisar o filme, é outra. Pena que fãs dificilmente conseguem fazer essa distinção.
      Seu como é. Cresci como fã de Guerra nas Estrelas, vi isso acontecendo em inúmeras convenções, mas sempre tentei mostrar os vários aspectos de ser fã para as pessoas. Idolatria unilateral e imutável é uma coisa ruim, para a pessoa, pq o astro nem liga se “sua paixão chega a doer” ou se você “sabe tudo sobre ele”. O que importa é o modo como cada um se relaciona com sua paixão especial.
      =D

      abs,
      Fábio

  10. Nossa, Barreto, discordo totalmente de você. Talvez eu perca um pouco o crédito por ser fã de quase todos os trabalhos do Michael Mann [tirando Miami Vice que não me desce]. Lembro num rapaduracast sobre os filmes de verão americano, e uma das grandes esperas era Inimigos Públicos. Então, eu estava em uma grande expectativa com esse filme e não me decepcionei. É interessante como as percepções mudam de pessoa pra pessoa. Tinha um grupinho de adolescente na sessã em que eu estava que saiu na metade do filme, resmungando que era chato. Eu só posso dizer que me deliciei em cada momento e que, para mim, foi uma experiência cinematográfica.
    Eu não conhecia nada da história do Dillinger real, e não sei se isso contribui para o impacto do filme sobre mim. Achei o modo como a história foi contada muito envolvente e emocionante, a fotografia lindíssima, a edição de som me fazia sentir estar presente no meio daqueles tiroteios, a trilha sonora divina. A interpretação do Depp foi verdadeira, cheia de sutilezas, de olhares e sorrisos que diziam mais que as palavras. Fora as cenas que vão ficar pra sempre na minha memória como as fugas, a visita do Dillinger ao centro de investigação, e a sequencia final no cinema, simplesmente perfeita.
    Desculpe a empolgação, só quis colocar minhas impressões do filme que foram tão diferentes da sua. De qq forma, quero reafirmar minha admiração pelo seu trabalho e dizer que adoro suas participações no rapaduracast.
    Abs.

    1. Patty,
      Eu achei que ficaria apaixonado, mas o Mann me frustrou. sei lá. Não consegui sentir empatia por nenhum personagem. Por exemplo, não dá pra entender pq a Billie se apaixona pelo Dillinger. As motivações são obscuras. Gostei de atores nesse filme, mas não dos personagens. Isso é um problema sério, logo, não consegui entrar nesse clima todo.
      Mas é isso aí. Discussão é isso. Entendo seus pontos e concordo, eles só não funcionaram comigo. =D

      bjs,
      Fábio
      ps.: obrigado pela visita! =D volte sempre!

  11. […] Como muita gente, conheci Johnny Depp em Anjos da Lei. Isso entrega a idade, mas tudo bem. =D Desde então gostei do sujeito, aí ele fez Edward Mãos de Tesoura e pronto. Claro que alguns filmes não me agradaram tanto, e ele também precisou aprender um truque ou dois, e ficou um tempão na memória. No geral, Depp é muito bom ator. Discordo das acusações de que ele sofre da “sindrome do palhaço” – só consegue atuar quando totalmente transformado no aspecto visual -, mas boa parte do que ele faz tem esse elemento forte, então é quase uma assinatura de estilo. Bom, tudo isso para dizer que estava empolgadão para assistir a Inimigos Públicos e, claro, entrevistar Johnny Depp. O filme é fraco e tem poucas chances de Oscar, mesmo com a atuação boa do Depp. Não dá para carregar um filme desses nas costas, enfim [leia crítica]. […]

  12. Nossa, eu estava na esperança que esse fosse um filme realmente bom, mas infelizmente me decepcionei no começo. Na verdade o estilo do diretor de câmera na mão durante as caminhadas, acompanhando de frente realmente me causaram náuseas e tonturas, gerando desconforto em todos que estavam por ai. Chegava a ser irritante toda hora que os personagens caminhavam, pois eles ficavam “quicando” em frente à câmera.
    Acho q em alguns momentos o filme ficou confuso, e sem nenhum climax ou algo que pudesse de fato empolgar o pessoal que assistia.

  13. […] Los Angeles, perto do lançamento de Inimigos Públicos [drama de época dirigido por Michael Mann; leia crítica aqui]. Oportunidade rara. Depp fala pouco com a imprensa. Simpatia e bom-humor marcaram o encontro, que […]

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