Saída de Larry King é o mais recente percalço enfrentado pela CNN, que se esforça para ser o terceiro canal mais assistido, vê, pouco a pouco, sua relevância ir embora e busca na nova geração de ouvintes e profissionais a saída para seu dilema ao completar 30 anos de existência.

por Fábio M. Barreto, de Los Angeles

A visão inicial de Ted Turner para seu canal de notícias 24 horas fez sentido por muito tempo. Mas lá se vão 30 anos desde a inauguração da Cable News Network, ou melhor, uma das siglas mais famosas do mundo: CNN. Responsável por coberturas histórias como as Guerras do Golfo, escândalos políticos e até mesmo a morte de Michael Jackson, no ano passado, a emissora já vinha perdendo espaço e, curiosamente, degringolou depois do falecimento do Rei do Pop. Embora seja motivada por razões pessoais, a CNN se prepara para perder sua Majestade com o anúncio do término do programa de Larry King, o mais longevo do gênero na História. Renovação promove evolução, mas ultimamente esse tem sido o ponto fraco da emissora que não sabe se populariza seu conteúdo, aposta de vez na Internet ou se mantém seu formato decano.

Larry King tem 76 anos de idade e passou os últimos 25 entrevistando os nomes relevantes da política, entretenimento, educação, sociedade e até mesmo os monstros criados pelo mundo dos reality shows e celebridades instantâneas. Vai encerrar o programa para passar mais tempo com a esposa e a família. Agora entendi as razões pelas quais ele andou negando entrevistas, justamente no momento do aniversário de 25 anos de seu programa, uma delas solicitei pelo Estado de S.Paulo, que, teoricamente, não receberia uma negativa. Faz todo sentido e é justo. Afinal, foram mais de 40 mil entrevistas no horário nobre, algo que Barbara Walters deveria pensar antes de se gabar tanto. E esse reinado vai acabar. Não agora, mas em breve, assim que a CNN encontrar um substituto para King, se é que tal escolha é possível. Um novo programa deve surgir no horário ou, no caso de extrema ousadia, um novo entrevistador surgirá para ocupar a cadeira e os suspensórios do veterano.

E aí surge o maior problema da CNN: renovação. Sem rumos e, recentemente, sem muitas estrelas próprias, a rede do Turner Broadcasting System luta por seu lugar, uma vez soberano e anos-luz à frente da concorrência. Esse cenário é comum no jornalismo e corriqueiro no cenário moderno com a inclusão das novas mídias e ferramentas online e portáteis. Teoricamente, isso não seria problema para a CNN, que sempre inovou em termos tecnológicos e se dispunha a abastecer os norte-americanos e, depois da fundação da CNN International, o mundo. Certaz vez, ouvi que a revista VEJA, do Brasil, não vende informação: ela vende opinião. O leitor consome, concorda, ou não, e tem assunto para a semana toda. A CNN aposta no espectador inteligente, ou melhor, no formador de opinião. E, pelo jeito, errou na decisão. Ela ainda influencia a quem pretende, mas falha com a massa.

Embora com política alinhada ao governo democrata de Bill Clinton, por exemplo, a CNN optou oficialmente por um caminho ético e direto: não-partidarismo e foco nos fatos. Como todo jornalista sonha ser até encontrar a dura realidade da política da imprensa, a rede insistiu na postura neutra. Construiu nomes monstruosamente famosos e poderosos nesse período, como Wolf Blitzer, Christiane Amanpour, Larry King e Anderson Cooper e, talvez, John King. Isso sem contar o lendário Lou Dobbs, que já tirou o time de campo. Nomes relevantes para um público adulto e altamente qualificado. Dinossauros para a nova geração, que compra manchetes rápidas e opinião curta e impactante. Já uma realidade casuada pelo efeito Twitter?

Mas a relevância e credibilidade desse pessoal deveria ser suficiente para manter a audiência, porém a Fox News fez algo inesperado com seu partidarismo descarado, aposta na opinião e sem deixar dúvida ao público de que ali se fala mal de democratas, do presidente e de qualquer tentativa de se criar um “Estados Unidos diferente do que seus pais viveram e ensinaram”. Houve polarização e, logo de cara, um grande pedaço dessa audiência foi escutar as besteiras por vezes exageradas e até racistas do concorrente sem pensar duas vezes. CNN continuou neutra e reformulou seu visual. Então veio a MSNBC com mais dinâmica, outro estilo e bastante integração online e opinião bem pontuada. E a CNN despencou para o terceiro lugar, onde está atualmente e registrando uma queda de 18% de 2009 para 2010.

A perda de King é a mais recente, mas não menos célebre e notória que a saída de Christiane Amanpour – contratada pela ABC e prestes a apresentar o programa The Week, a partir de agosto – e o fiasco local de Campbell Brown, que ocupada o horário das 20h, o mais relevante em termos de notícias. Curiosamente, o estilo desses três nomes está diretamente ligado à reportagem, noticiário ou entrevista direta e sem tomar partido. Amanpour era um dos grandes pilares da emissora, Larry King o outro. Brown não chegava perto e perante sua fraca performance, pediu para sair. No momento, a CNN está bamba e se mantendo às custas de seu terceiro pilar: seu nome.

Tudo isso acontece em meio às férias de Wolf Blitzer, o único grande bastião desses 30 anos. Anderson Cooper é dinâmico, inteligente e mete as caras nas reportagens, mas não é o homem do horário nobre. Seu programa é aprofundado, pensado e extenso. Algo semelhante a um Globo Repórter feito ao vivo e com entrevistados realmente relevantes ao assunto. De qualquer forma, uma válvula de escape para o espectador fiel, que pode dormir tranqüilo. O mesmo não pode ser dito sobre a programação diária.

Se já havia sinais claros de falta de rumo na CNN, o caso do Balloon Boy afastou qualquer dúvida. Mas essa festa da mudança maluca continuou acontecendo a cada novo programa e, especialmente, com a aposta infrutífera de abandonar o jornalismo em prol da interação com o internauta – ou melhor, usuários do Twitter e do Facebook – na hora do almoço com Rick Sanchez, cuja pauta se limita a opiniões disconexas de seu âncora, com leitura de tweets e uma tentativa de soar moderno. A “Conversa em Âmbito Nacional” proposta por Sanchez nunca acontece. É um monólogo chato, irrelevante e cheio de pretensões. O cenário só piora com os excessivos comerciais e, por vezes, blocos nos quais o apresentador aparece para fazer a chamada do que está por vir. Esse estilo pode facilmente levar um nome conhecido no jornalismo, e, anteriormente, odiado pela CNN: sensacionalismo.

Como esse time não está ganhando, está na hora de mudar. E as tentativas estão acontecendo, mas sem a menor certeza. Para o lugar de Campbell Brown, o canal contratou uma dupla improvável: Eliot Spitzer (ex-governador de New York, que foi forçado a renunciar depois de ser flagrado num escândalo sexual) e a jornalista Kathleen Parker, vencedora do prêmio Pulitzer. Spitzer é ótimo debatedor, deu vários shows na mesa redonda de Bill Maher, na HBO, e foi sondado também pela MSNBC, mas é figura controversa especialmente por seu pequeno incidente. Eles prometem promover um debate mais amplo, incluindo assuntos como, veja só, Copa do Mundo e ir a fundo em tópicos como o recente afastamento do Gen. Stanley McCrystal, que foi derrubado depois de artigo publicado pela revista Rolling Stone. Ou seja, vale tudo, contanto que o pacote seja atraente.

Pensando assim, toda vez que vale tudo, é por que não há certeza de nada. A Fox News é burra, partidária e feita para imbecilóides ultranacionalistas, mas encontrou seu nicho no que deveria ser a minoria. Enquanto a CNN continuar apática e acreditando em formato sobrepondo a força do indivíduo na frente da câmera, seu futuro é mais inseguro do que seus focos atuais. Manter-se relevante é o maior dos desafios; e eles têm um longo caminho pela frente.

Veja o vídeo da despedida:

Fábio M. Barreto

Fábio M. Barreto novelista de ficção, roteirista e diretor de cinema e TV. Atuou como criador de conteúdo multimídia, mentor literário e é escritor premiado e com vários bestsellers na Amazon. Criador do podcast "Gente Que Escreve" e da plataforma EscrevaSuaHistoria.net.
Atualmente, vive em Brasília com a família.

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8 Comments

  1. Bicho… Dia desses, quando vi aquelas opiniões sobre o futebol de Glenn Beck na Fox News, entrei num chat de IRC que uso sempre com americanos.
    Perguntei a opinião deles sobre esse tipo de coisa…
    Eles falaram que eu não devia dar muitos ouvidos à CNN, Fox News e MSNBC, porque a maioria das notícias jornalísticas deles tendem ao sensacionalismo (fora que a FOX News é um lixo MESMO) e etc…
    E tu, que vive aí (eu só pego CNN Internationl e Fox News), o que tu acha?

  2. Qualquer opinião que eu desse seria muito rasa porque eu não conheço de perto a situação da TV nos eua. mas dá para eu opinar sobre o seu texto, e ficou fantastico.

  3. […] This post was mentioned on Twitter by Rosana Hermann, Felipe Lima, Paulinha Mendes and others. Paulinha Mendes said: Que susto, pensei que o Larry King havia morrido! http://www.soshollywood.com.br/cnn-perde-a-majestade/ […]

  4. Adeus a Larry King: CNN perde a majestade. http://bit.ly/97MnBx #tv

  5. RT @poltrona Adeus a Larry King: CNN perde a majestade. http://bit.ly/97MnBx #tv

  6. RT @alerocha: RT @poltrona Adeus a Larry King: CNN perde a majestade. http://bit.ly/97MnBx #tv

  7. RT @alerocha: RT @poltrona Adeus a Larry King: CNN perde a majestade. http://bit.ly/97MnBx #tv

  8. E cai mais um mito da TV americana.
    Tal como o @OtavioCohen, aí em cima, não conheço de perto o estado da TV americana, mas conheço um bocadinho (bem pouquinho) da TV brasileira.
    Por tudo que li aí, uma coisa ficou clara para mim: a CNN nunca quis ser uma Rede Globo, destruir programas que poderiam ser fantásticos como o Programa do Jô, que por mais que critiquem o jovem-idoso, ele é com certeza um ser que sabe prender a nossa atenção, cativar nossa hora preciosa diante de uma TV. Mas aí pegaram o programa e transformaram ele num espicha-Globo (já que faz um tempo que quase 99% dos programas tem pelo menos UM integrante da Globo, como um todo).

    E o dilema fica: investir na imparcialidade (e talvez irritar à gregos e troianos? ou numa postura com a maior imparcialidade.

    Valeu Batterão

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