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Fanboys é homenageia a paixão de várias gerações, com sinceridade, bom-humor e muito carinho. Faz rir e chorar. É o verdadeiro orgulho nerd, especialmente se você gosta de Guerra nas Estrelas.

Trabalhar com cinema em Hollywood sempre me coloca em contato com filmes inesquecíveis, históricos e com aquela capacidade de ditar os rumos da indústria, mas há momentos pessoalmente modificadores. E isso nunca acontece por causa de blockbusters milionários ou filmes cheios de hype. Num ano com direito a Star Trek, Harry Potter, Exterminador do Futuro, foi um filme pequenino e irrelevante comercialmente que entrou para meu Top 5 de todos os tempos. Por questões mais que pessoais e óbvias, claro que estou falando de Fanboys, dirigido por Kyle Newman.

Coisas do destino, mas fui assistir Fanboys no Chinese Theatre, local da icônica foto das filas de Guerra nas Estrelas, em 1977. Tinha algumas horas vagas entre entrevistas com o Evangelini Lilly e o elenco de Brothers & Sisters, que incluía Sally Field, no complexo Highland & Hollywood, que engloba o cinema. Resolvi descer as escadas para ver alguma coisa e eis que Fanboys estava em cartaz.
Cheguei 5 minutos atrasado e com medo de não encontrar ingresso. Alguns lugares não permitem entrada depois do início da sessão, então nunca se sabe. Consegui e entrei correndo. Notei que estava praticamente vazio. Mas corri pro meio da sala e assisti ao filme. Só mais tarde perceberia que não havia mais ninguém lá. Foi uma sessão só minha.

Logo, ninguém me viu chorar. Ninguém me viu rir. Ninguém me viu entrar num mundinho especial, como se boa parte da minha vida estivesse sendo exibida na tela. A premissa de quatro amigos dispostos a tudo para invadir o Rancho Skywalker e roubar uma cópia de Episódio I, ou, pelo menos, assistir antes do resto do mundo. Mas a causa é justa: Linus, um dos amigos, está com os dias contados e sabe que não vai resistir até 19 de maio, data de estréia do filme.

Compreendo perfeitamente os motivos que levaram Fanboys a ser considerado dúvida por tanto tempo. Não é um filme comercial, fez apenas US$ 700 milhões e tem difícil entendimento para um não fã. Fanboys é muito mais que um filme, é um manifesto sobre a alma de cada fã de Guerra nas Estrelas, seja ele velhaco da primeira geração, seja um garoto recém-cativado por conta de Guerras Clônicas.

Isso acontece por conta dos pequenos detalhes do roteiro. Conhecer um personagem que tatuou Jar Jar Binks e a versão mirim de Anakin Skywalker nas costas, apostando no “inevitável” sucesso da dupla é algo, ao mesmo tempo, hilário e digno de pena. Afinal, aja cirurgia à laser para remover aquilo depois da estréia do filme. Ou então ficar emocionado pelo simples fato de os personagens entrarem no escritório de George Lucas. O que pode é mera cena para uns, pode significar muito para outros.

E justamente por isso, não há remorso por Fanboys não ter estourado nas bilheterias ou ser o “novo Homem de Ferro”. O fã verdadeiro cria um sentimento de posse desses momentos, como se cada cena com ligação mais afetiva – ou reflexo de momentos de nossas vidas – deva ser nossa, sabe? Nada de garotada simulando diálogos ou vestindo camisetas toscas em convenções de animes. Ali a coisa é séria, pois, as gerações que cresceram com Guerra nas Estrelas na veia sabem da relevância e do respeito requerido pela Saga.

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Dediquei pelo menos 12 anos da minha vida a Guerra nas Estrelas; editei um fanzine impresso, o Intrepid; fundei o Conselho Jedi São Paulo; fui um dos idealizadores da JediCon; comandei a realização da primeira delas e fui o alucinado que topou fazer a versão de 2001 em três meses; perdi dois empregos pelo simples fato de “ser nerd e não me conter”. Mas, em contra partida, conheci minha esposa numa das convenções, e devo minha carreira e minha segunda língua à Santa Trilogia. Uma trajetória como essa, inevitavelmente, se vê refletida em Fanboys.

É aquela paixão pura, sem interesses. É a vontade de discutir até o último momento sobre as coisas mais “improváveis” para um não-nerd como, por exemplo, as primeiras versões da história de Boba Fett, que um dia já foi um Jaster Mareel [ultimamente, com a modinha de ser mandaloriano, que inclui até gente estudando a “língua”, o personagem ganhou vida própria e sem relação com Fett], antes mesmo de qualquer um imaginar o nome Jango Fett ou qualquer surto da nova trilogia.

Chorei quando Carrie Fisher entrou em cena. Ri feito criança na participação especial dos Ewoks. Mergulhei em minhas memórias quando Sam Huntington precisou decidir se trabalharia para o pai ou seguiria naquela missão maluca. Fiquei maravilhado com o bom-humor saudável. E preciso ter uma placa “Flash If You Like Wookiees!” no meu carro! =D

Existe muito mais em Fanboys do que uma infinidade de referências e piadas de gênero. Há algo mais ali, algo que só um fã poderia compreender: os laços que unem aqueles amigos, claro que Guerra nas Estrelas é o denominador comum, mas serve apenas como plataforma para uma história cheia de lealdade e sacrifício. Ser um “fanboy” já não soa bem em muitos lugares, fica um pouco pior com matéria oportunista no Fantástico e nos transforma em pessoas que vivem em função de um assunto ou paixão. O que, na verdade, é o inverso.

Assim como os personagens de Fanboys, ser nerd é parte de um estilo de vida que sempre foi motivo de orgulho – com ou sem dia, com ou sem aceitação pública – e de competência. Afinal de contas, excetuando-se torcedores fanáticos de futebol, que outro nicho é capaz de assimilar tanta informação sobre o foco de sua paixão como os nerds? Groupies de bandinhas teen fazem isso, mas só até perceberem que o mundo é maior e a febre passa. Ser nerd não tem prazo de validade, não tem limite de HD, não termina quando outra moda começa.

E, no caso de Fanboys, vai até o último minuto da vida. Pena que todo o esforço tenha sido para Episódio I – A Ameaça Fantasma. O filme do Jar Jar e do “oops” do Anakin. O filme que colocou tudo a perder. De qualquer forma, nada disso impediu o sonho daqueles quatro amigos, que peitaram trekkies – aliás, William Shatner participa de forma sublime – em território inimigo, em Iowa, e, depois, numa convenção de Jornada nas Estrelas; desafiaram a segurança do Rancho Skywalker, com direito a show particular de Ray Park [Darth Maul] e, acima de tudo, ainda leva Kristen Bell a tira colo.

Lembro que quando entrevistei Steve Sansweet, o fan relations da LucasFilme, durante a Comic-Con, durante o Star Wars Fan Film Fest e, no dia seguinte, durante as entrevistas para Star Wars: The Clone Wars, ele fazia questão de dizer que George Lucas havia apenas concordado com o filme, se negando a qualquer apoio oficial ou investimento. Aliás, não fosse por Kevin Spacey, Fanboys ainda estaria esperando por distribuição. LucasFilm errou nessa, pois, não importa quantos fã-filmes com efeitos de sabre de luz ou cenários em CGI passem pela mostra oficial e sejam reconhecidos e elogiados pelos canais oficiais, nenhum deles jamais vai retratar a essência de um fã de Guerra nas Estrelas como Fanboys fez.
É o legado de várias gerações. Pessoalmente, uma autobiografia nérdica. Sem estardalhaço. Sem hype. Honesto e sincero como deveria ser. E que continue assim ao longo dos anos, como nosso momento de catarse, nosso cantinho secreto para curtir sozinhos , ou com os amigos mais próximos, algo que só nós, fãs, nerds, aficionados, somos capazes de compreender. Um verdadeiro desígnio da Força, e sem George Lucas para atrapalhar.

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Reportagem: Fábio M. Barreto

Fábio M. Barreto

Fábio M. Barreto novelista de ficção, roteirista e diretor de cinema e TV. Atuou como criador de conteúdo multimídia, mentor literário e é escritor premiado e com vários bestsellers na Amazon. Criador do podcast "Gente Que Escreve" e da plataforma EscrevaSuaHistoria.net.
Atualmente, vive em Brasília com a família.

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8 Comments

  1. Fanboys realmente é um dos melhores filmes que eu já vi, me marcou demais, me fez rir demais, e para ser mais gay ou nerd possível quase chorei no final, é a homenagem definitiva a um marco cultural do século XX e para não dizer da história da humanidade!

    Obs: Barreto o novo site ficou muito bom msm!!!

  2. Barretão, que site “massa”.
    Como sempre, já está no meu Favoritos.
    Sobre o filme em questão, curti muito. Desde que me entendo por gente, gosto de Guerra nas Estrelas, mas nunca fui um “fanático” (no bom e no mau sentido).
    O filme realmente dá brechas pra gente rir muitoe achei o diálogo final impagável, pois temos de certeza de que o que eles veriam era uma B*….
    Grande abraço.

  3. Barreto, sensacional crítica. Concordo com você… o filme é mágico! E olha que nem sou tão fã assim da série Star Wars. Mas esse filme é lindo, tem a alma de filmes como Os Goonies, que marcou minha infância. Lindo filme! Parabéns pelo site e pelas críticas.

  4. Otima critica !!!
    Fiquei com vontade de ver …

  5. Ótima crítica, sempre ouvi falarem muito bem desse filme, vou procurar assistir. E Barreto, não sabia que você era tão Jedi assim não, hehe. Té mais*_*

    1. Esse é um lado meu que a “nova geração” de amigos e leitores não conhece, Vagno. Aliás, tem coisa boa de Guerra nas Estrelas no Rapadura de hoje! =D

  6. Teu texto foi tão bom quanto o filme!! me senti um pouco babaca me emocionando com o filme e só depois de ler teu texto que descobri que ele falava da minha paixão por scifi desde pequeno… parabens!!!

  7. Alguem pode me dar o end do rancho Skywalker para eu mandar uma correspondencia:
    Me mande e-mail : goiasrul@hotmail.com

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