Roland Emmerich volta a falar sobre A Fundação, adaptação da obra-prima de Isaac Asimov, para os cinemas.

Há notícias e há fatos históricos. Por mais exagero que pareça, quando Peter Jackson revelou seus planos para adaptar O Senhor dos Anéis[bb], muita coisa mudou, seja pelo aspecto de se fazer filmes, seja pelo simples fato de que gostar da obra de Tolkien[bb]deixou de ser regalia dos leitores, que desde então dividem opiniões com os fãs 100% audiovisuais, que só viram no cinema, pouco se importam com O Silmarilion e etc. O público literário se vê, novamente, diante de situação similar, mas, agora, o assunto é Isaac Asimov. Ou melhor, A Fundação, sua obra máxima. Hari Seldon e a saga de Terminus tem novo destino: o cinema!

Já não era muito segredo em Hollywood, mas, finalmente, Roland Emmerich[bb] volta a falar sobre seu envolvimento [que agora parece ser definitivo] com a adaptação de A Fundação, à MTV norte-americana. Ele havia comentado sobre o projeto durante a Comic-Com 2009, quando falou sobre o roteirista, mas depois ficou quieto. Há alguns meses, quando o SOS Hollywood entrevistou o diretor por conta do lançamento de 2012, ele se esquivou do assunto, mas agora parece não haver mais volta. Durante a entrevista, Emmerich comentou sua visita ao set de filmagens de Avatar e deixou claro sua pretensão de filmar a obra em 3D. “É o jeito mais moderno de se fazer cinema”, disse.

Pelo jeito, o projeto envolve três filmes [possivelmente A Fundação, A Fundação e o Império, A Segunda Fundação] e o uso de computação gráfica será pesado. “Não saberia fazer de outra forma”, comentou Emmerich. Todo esse assunto é muito delicado, afinal de contas, a Trilogia da Fundação cobre milênios de História da Humanidade e, embora tenha seus rompantes de ação e a presença de elementos ficcionais intensivos, essa trajetória é focada nos homens presentes em seus momentos cruciais. É uma obra humana, acima de tudo.

Emmerich já teve seus momentos nesse campo. Soube fazer bem a construção de Daniel Jackson de James Spader, em Stargate; e, por que não, tratou de maneira adequada o Benjamin Martin de Mel Gibson, em O Patriota [sem entrar no mérito das similaridades com Coração Valente]. Entretanto, sua produção recente tem se distanciado da profundidade e primado pelo efeito sobrepondo o homem, idéia totalmente contrária ao âmago da Fundação. Asimov criou um futuro, evoluiu sua tecnologia, exibiu sua derrocada e renascimento, mas sempre através das relações humanas; afinal, de que serviria a psicohistória de Hari Seldon sem as massas para dar-lhe volume e os homens chave para executá-la [ou meramente dar vazão a seus desígnios?].

Durante meu papo com Emmerich, ele reafirmou sua decisão de abandonar os filmes apocalípticos e se dedicar projetos mais intelectuais. Faz bem, pois, embora seja o melhor quando é necessário destruir o mundo ou inventar mundos abilolados, tempo demais num mesmo gênero se torna problemático. A pergunta é: quando resolver embarcar de vez na realização de A Fundação, terá passado tempo suficiente longe da diversão visual gratuita a ponto de encarar Asimov da maneira necessária?

Há uma razão primordial que impediu qualquer tentativa de adaptação de A Fundação até hoje: respeito. Não pode haver erros. Peter Jackson e James Cameron já provaram que o impossível não existe mais. Provavelmente, A Fundação é o último dos “infilmáveis” da Ficção Científica e sua realização acontece num momento prolífico e positivo na arte cinematográfica. Existem as condições técnicas, uma nova linguagem [o 3D], já que a FC é por definição vanguardista e rompe barreiras, nada melhor que surgir num momento de avanço indiscutível; o dinheiro; e, acima de tudo, um mercado pronto para receber produções do gênero e transformá-las em êxito financeiro [leia mais na matéria de capa da Sci-Fi News, 144, já nas bancas!].

Sugiro torcermos por duas decisões vitais nesse projeto:

1) Roland Emmerich e Harald Kloser ficarem longe do roteiro [Emmerich diz já ter contratado Robert Rodat, roteirista de O Resgate do Soldado Ryan e O Patriota. “Lodat é aficionado pela obra e sabe tudo de cor e salteado”;

2) Tanto estúdio [ainda não-definido/divulgado] quanto Emmerich compreenderem que o personagem principal da história é a Fundação, não Hari Seldon, os Prefeitos, os Comerciantes ou o Mulo e Golan Trevise [como os livros não foram definidos, vai saber].

O risco é tremendo e, embora goste e respeite o trabalho de Emmerich, considero a escolha errada. Por razões muito pessoais e pelo reconhecimento no tratamento cinematográfico, gostaria de ver Paul Thomas Anderson ou Darren Aronofsky no comando desse projeto; ou então um nerd e fã assumido como foi Peter Jackson para O Senhor dos Anéis. É da paixão ou domínio total da linguagem que surgem os melhores “livros do cinema”. Basta olhar para Avatar. Infelizmente, Emmerich não se encaixa em nenhum dos dois elementos.

Espero que o precursor de Hari Seldon já tenha computado isso na fórmula psicohistórica, ou que o primeiro dos Segundo-Fundacionistas esteja por perto. Essa adaptação simplesmente não pode falhar. O maior legado da literatura de Ficção Científica está em jogo. E Emmerich sabe disso.

por Fábio M. Barreto,
de Los Angeles

Fábio M. Barreto

Fábio M. Barreto novelista de ficção, roteirista e diretor de cinema e TV. Atuou como criador de conteúdo multimídia, mentor literário e é escritor premiado e com vários bestsellers na Amazon. Criador do podcast "Gente Que Escreve" e da plataforma EscrevaSuaHistoria.net.
Atualmente, vive em Brasília com a família.

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10 Comments

  1. Fico com os três pés atrás ao se falar em Fundação nos cinemas. Os motivos, óbvios para quem leu a série, foram até citados na matéria. E discordo em um ponto importante: para mim o caso não é semelhante a adaptação do senhor dos Anéis, onde a dúvida principal era o aspecto técnico. Aqui, o que complica uma adaptação é a estrutura da história em si.

    Tenho medo que façam como “Eu, Robô”, peguem alguns aspectos da história e levem para o cinema uma “livre adaptação” da obra. Basta lembrar, que não são duas obras lá muito diferentes. Eu, Robô é uma coletânea de contos, e Fundação pode ser, superficialmente, até descrita assim, já que uma história não tem lá muita ligação, direta, com a outra (na verdade tem, mas deu para entender o ponto :P).

    A pergunta que fica é “simples”: Como fazer um filme sobre mil anos de história, que não possui personagens fixos e se quer tem um “final”?
    O difícil é a resposta xD

    1. Nemorendil,

      Acredito que até por serem três filmes, não seja possível acontecer o mesmo que em Eu, Robô. Mas não coloco minha mão no fogo.

      Quando falei sobre aspecto técnico, foi justamente pela condição de essa história, como você colocou, poder ser adaptada no tom certo e impedir que os efeitos ou cenários/elementos futurísticos e extraterrestres roubem a cena. Trantor tem que ser uma maravilha, até melhor do que a Trantor Moderna – também conhecida como Coruscant, de Star Wars – mas sua complexidade não pode superar a importância das cenas em que aparece. Bons roteiristas sempre existiram, mas Hollywood está cheia de casos de grandes histórias que se transformaram em surtos completos por conta de efeitos mambembe ou diretores malucos. Por isos não gostei do Emmerich como diretor, primeiro precisa se distanciar das explosões e imbecilidades – aka Tigre de 10.000 a.C. – para depois fazer isso.

      E agora é minha vez de discordar: acho que tem final sim! Ou melhor, tem uma conclusão. Sempre encarei a decisão de Golan Trevise como a conclusão de todo o arco iniciado em O Fim da Eternidade. 🙂

      Abs,
      Fábio

  2. Eu até achava os primeiros filmes do Emmerich divertidos, mas os seus últimos estão sendo destestáveis. Já o estou boicotando. Não sei se ele é a pessoa mais indicada para filmar Fundação, estou com o livro e espero ler em breve. E Barreto, ainda existe sim mais uma ficção “infilmável”, é o livro Encontro com Rama de Arthur Sir Clark, este projeto está nas mãos de Morgan Freeman e David Fincher a um tempão. O livro é fantástico!

    1. Vagno,

      Está certo. Encontro com Rama está nesse grupo. Além de ter escrito isso na madrugada, nunca fui muito fã do titio Clarke e, por essa falha de caráter. haha., acabo esquecendo dos livros dele. Obrigado pela lembrança! 😀

      abs,
      Fábio

  3. Fábio,
    Sobre o final do livro, concordo completamente com o que você disse. O ponto não era exatamente esse, quando disse que não tinha final, e até ressaltei isso com um parêntese ali, me referia a uma conclusão, digamos, convencional. Aliás, me referia a trilogia original, e não entrei no mérito de Fundação II pura e simplesmente por não ter idéia se vão tocar nisso. Até porque, isso cria um problema óbvio: quando vão parar? Ao fim da trilogia original? Ao fim de Fundação II? Ou vão tocar nos livros “pós-Asimov” (que nunca li e mal sei do que se trata).

    Se a intenção é adaptar a trilogia original, convenhamos que o público “comum” vai custar a engolir o que ocorre em Fundação. Não consigo imaginar como será bem recebido o que ocorre ao término do livro, e o “buraco” que existe entre a conclusão da saga e a fundação de um novo império (escrevo assim só para não escrever spoilers xD). Sei lá, posso até estar menospresando o público, mas não vejo como um público de blockbuster (e fundação tem que ser assim, dado até o orçamento que essa beleza deve ter) vai receber bem, e entender, isso.

  4. Estou bastante chateado com a decisão do produtor de ter escohido Emmerich para filmar Fundação.
    Acho ele um diretor muito “Hoolywoodiano”. Ele é bom com Sci-Fi, não Ficção Científica.
    Ele sabe dirigir filmes de ação, mas Fundação, como sabemos, é o social que vale.
    São muitas as barreiras a serem venciadas. Eu torço para que a adaptação seja o mais fiel possível.

    Um abraço, pessoal.

  5. Fabiovisky, quanto tempo, amigo!
    Concordo 100 por cento com você; Emmerich ligado a Fundação??? MEDO!!!
    E vocês aí, como andam? Espero que tudo excelente. Apareça, meu!
    Grande abraço

  6. Concordo com a maioria dos pontos da materia.

    algumas concideraçoes. Paul Thomas Anderson seria a PIOR escolha, com certeza. Nao sou fan do Roland, mais olhem bem para a serie resident Evil. Era pra ser uma filmagem do jogo, mais o Paul criou personagens do nada e ferrou a serie. ele sabe fazer filmes, mais nao sabe acompanhar uma historia como é para ser.

    Voltando á serie Fundação, vale lembrar que na verdade a serie completa tem mais de 14 livros, desde os contos de Eu robo, depois chega a era dos Espaciais, depois a Ascenção do imperio Galactico, ai entao entra a serie fundaçao. Por isso eu sou de opiniao que deveria ser produzido um Seriado, e nao um filme.

    vale lembrar tambem que NUNCA eles vao dar um jeito de exprimir todos os fatos de Fundação em 2 – 3 horas. So a parte de Hary Seldon, no começo, ja deveria ocupar o tempo de um filme inteiro.

    eles deveriam fazer um filme de “preludio da Fundação”, ja que é uma historia mais localizada, em uma epoca só. Isso ja seria um “treinamento” pra fazer a serie principal.

    Outro ponto é que filmes geralmente tem que ter um “climax” porem em Fundação, tem um climax a cada “ERA”, se for para ser fiel ao livro, o Filme 1 tera no minimo 30 horas de duração…

    bom, sabendo que nao vai sair nada de maravilhoso em relação ao livro(é sempre assim) vamos assistir o filme e ver por nos mesmos…

    creio que todos os fans ja tentaram convencer algum amigo a ler, e esse amigo nao quis. quem sabe se assistir o filme esse pessoal “sem cultura” decida ler o livro.

    1. Fala Wishmaster, so’ um ponto: Paul Thomas Anderson e’diretor de Sangue Negro. Paul S.W. Anderson e’ diretor de Resident Evil.

      😉

      Abs,
      Fabio

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