Alice no País das Maravilhas testas os limites da imaginação com grande força visual e um 3D moderado. Tim Burton moderado? Leia e descubra por que!

Imaginação é uma das maiores dádivas da raça humana. Toda criança sabe disso. E Charles Lutwidge Dodgson sabia disso. James M. Barry também sabia. Tolkien passou dos limites, positivamente, mas, essencialmente, imaginar muito era fundamental na virada do século 19, um período de tecnologia feiosa, perspectivas amargas e poucas cores – especialmente na Inglaterra industrial. Atualmente, as coisas mudaram e imaginar perdeu aquele tom pessoal para muita gente – não a maioria, mas, ainda assim, muita gente. O cinema conta as histórias e o 3D coloca o público lá dentro num momento positivo para a tecnologia visual. E, justamente nesse momento, Tim Burton apresenta sua Alice no País das Maravilhas ao mundo. Porém, antes do deslumbre, é necessário precaução e atenção. Ah sim, Dodgson é o verdadeiro nome de Lewis Carroll.

As comparações com Avatar serão inevitáveis, mas não por mérito, pelo contrário, pela escassez de argumentos válidos na internet e na memória cada vez mais curta dos novos jornalistas impressos. A capacidade de analisar um filme pelo que ele é perde força e, com isso, se perde a habilidade de realmente compreender e apreciar as minúcias de um trabalho visualmente primoroso como esse. Alice no País das Maravilhas não é perfeito, mas suas poucas falhas são incapazes de desmerecer a obra, que sempre esteve nos planos de Tim Burton, fã assumido da história desde a infância.

Revisitar o País das Maravilhas visualmente não é tarefa fácil, entretanto, sua natureza surreal permite grande exercício criativo da produção. Pode não ser o seu ou o meu País das Maravilhas, mas com certeza se parece – ou não – com cada versão já imaginada. Os elementos estão lá: o Gato de Cheshire, a Lebre de Março, o Chapeleiro Maluco, a Rainha de Copas, as peças de Xadrez da Rainha Branca e o temível Jabberwocky.

É prato cheio para mentes imaginativas como a de Burton. Tudo é real, surreal e irreal, com menos cores do que a idéia transmitida pelas campanhas de pôsteres. Ou melhor, as cores estão lá, entretanto, com menor saturação e causando uma sensação mais real. Um resultado próximo do visual cru de Sweeney Todd, por exemplo. E as comparações param por aí.

A mistura do 3D com live action funcionou bem e ajudou a história na maioria dos casos. Única exceção ficando nas mãos do Valete de Copas, interpretado por Crispin Glover (o pai de Martin McFly). De forma inexplicável, o personagem – homem “comum”- foi totalmente digitalizado (exceto por sua cabeça) e animado ganhando um movimento desajeitado e artificial. Decisão possivelmente tomada por conta de sua constante integração com seu cavalo – esse sim computadorizado -, entretanto, com resultado negativo. Pelo aspecto positivo, o Coelho Branco está perfeito, assim como Helena Bonham Carter e sua Rainha de Copas, com seu cabeção! A Tea Party (ou Lanche da Tarde, na tradução mais aproximada) também ganhou muito realismo e bela integração entre Johnny Depp (Chapeleiro Maluco), Mia Wasikowska (Alice) e os personagens computadorizados.

Exagerado com cores por um lado, ponderado no uso da tecnologia 3D pelo outro. Isso mesmo, Tim Burton foi contido. É uma presença discreta e com função bastante dramática. Essa é a resposta à declaração esnobe de Jason Reitman ao SOS Hollywood sobre “quem quer ver uma lágrima em 3D?”. Novamente, o 3D se apresenta como linguagem e garante aquele conhecido mergulho num novo mundo. É o público seguindo o Coelho Branco e despencando buraco abaixo durante sua visita ao País das Maravilhas.

O 3D de Alice no País das Maravilhas serve à profundidade, à perspectiva e também ao senso de realidade da história, seja na fumaça da Lagarta, na Tea Party ou na integração entre Alice e todos os demais personagens. Por esse aspecto, Tim Burton nunca pode ser acusado de ter exagerado. Fez o certo, ousou em outros aspectos, mas manteve sua história e personagens no primeiro plano, enquanto objetos, árvores e backgrounds ficavam nos seus devidos lugares.

Como tudo no universo de Alice é passível de diversas opiniões, interpretações e mutante, as escolhas de Tim Burton em relação ao 3D seguem a norma, não imitando os filmes mais recentes como Avatar, ou tentando revolucionar e reinventar. Burton simplesmente usou uma ferramenta criada sob medida para histórias como essa ou O Mágico de Oz, por exemplo, para entreter o público. Ele testa os limites da imaginação, se é 3D ou não, pouco importa.

Dentro da cinematografia de Tim Burton, Alice no País das Maravilhas não encontra paralelo, ou gênero. É tudo novo, até mesmo para ele. Comparar é tão Flinguntaken quanto uma boa Fragenlaken!

por Fábio M. Barreto,
de Los Angeles

Fábio M. Barreto

Fábio M. Barreto novelista de ficção, roteirista e diretor de cinema e TV. Atuou como criador de conteúdo multimídia, mentor literário e é escritor premiado e com vários bestsellers na Amazon. Criador do podcast "Gente Que Escreve" e da plataforma EscrevaSuaHistoria.net.
Atualmente, vive em Brasília com a família.

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10 Comments

  1. [Especial Alice] Análise do Visual e do 3D de "Alice no País das Maravilhas". http://vqv.me/s/Vi

  2. RT @soshollywood: [Especial Alice] Análise do Visual e do 3D de "Alice no País das Maravilhas". http://vqv.me/s/Vi

  3. RT @soshollywood
    [Especial Alice] Análise do Visual e do 3D de "Alice no País das Maravilhas". http://vqv.me/s/Vi

  4. muito belo texto…!

  5. @wikersonlandim Mas "uso do 3D sem nenhum propósito" não é o caso de Alice. http://www.soshollywood.com.br/alice-3d/

  6. RT @soshollywood: Mas "uso do 3D sem nenhum propósito" não é o caso de Alice. http://bit.ly/93mRtY // Confio na opinião do Fábio.

  7. Pelo jeito o 3D é apenas um mero detalhe perante a obra de Burton, ao contrário do que foi visto em Avatar.

  8. […] demais personagens do mundo maluco e tresloucado conhecido como País das Maravilhas. Ao optar pelo uso contido da tecnologia 3D, Tim Burton coloca a responsabilidade nas costas de seu elenco, muito valorizado, mesmo inserido […]

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