Los Angeles é a capital mundial do puxa-saquismo cinematográfico. Chega a dar medo!

Essa coisa de bater palmas sempre me levava às noites de Oscar, com tudo mundo aclamando o Scorsese, o Clint, o Nicholson, sei lá, algum desses caras formidáveis. Cheguei aqui e tudo foi pelo ralo. Foi na exibição restaurada de 101 Dálmatas – a versão do DVD bacana da Disney. O povo começou a bater palmas depois que o representante da companhia apresentou o filme! É, ele deu boa noite, falou do que se tratava e pediu para começar a exibição. Bateram palmas!!!

Fiquei passado! Máquêêêê?! Beberam?!

Bom, logo alguém me disse. “É o pessoal de TV”, eles são aparecidos e puxam o saco descaradamente. Pensei comigo, bem, cada um com seus interesses. Só esperava que não fizessem isso durante o filme. E não fizeram. Mas foi só a primeira linha de crédito subir e pimba: mais palmas! Filme super novo, o diretor e o estúdio precisam de força para se firmarem, sabe. Ah vá!

Isso continuou acontecendo nas grandes junkets, mas como o pessoal de TV sempre estava lá, desconsiderei e coloquei a culpa neles. Beleza. Mas aí veio O Incrível Hulk. Mega evento dentro do Universal Studios, como relatei aqui, celebridades e o pacote completo. Mais de mil pessoas no anfiteatro. Filme começa. Palmas. Mas que diabos?!

Calma, não era o filme. Era a vinheta da Universal. Palmas para ela. Palmas?! Já não viram aquilo antes? Ok, estávamos na casa deles, melhor prestigiar. Uma vez passa.

Surge aquela abertura da Marvel. Mais palmas! Uns 4 negos ficaram de pé. Comecei a ficar com medo. Humm, algo estranho aí. Menos de 1 minuto e duas salvas de palmas gerais com direito a gente de pé?

Nesse ponto eu desconfiava que existia alguma senha secreta para ganhar brinde depois da sessão ou, quem sabe, uma carona para casa. Mas lembrei que já estava de carro, então carona não podia ser. Brinde sempre é bom. Seria aquele guaraná amarelo e porco que o Stan Lee toma? Humm. Se a senha existia, ou não, eu com certeza não passei no balcão de informações, logo, dançaria de verde e amarelo. Malditas senhas!

Aí começam os créditos. Adivinha? Palmas! Falta de criatividade total! Podiam cantar algo, inventar um daqueles passinhos bregas das boates brasileiras nos anos 80, sei lá, improvisa. Cansa, sabe. Mas não, palmas.

Nome do diretor? Palmas para ele! Produtores? Alguma dúvida? Palmas! Nem preciso dizer que o nome de Edward Norton fez com que umas 20 mulheres tentassem suicídio ao dar piruetas no ar e gritando “iuuupie” ao mesmo tempo em que batiam palmas. Aí eu tive certeza: é um código social, se não bater palmas deve ter um detector, conectado ao sistema de câmeras que, automaticamente, vai dizer para o segurança negão (aquele armário 2×2 que meteu medo no Lou Ferrigno, conhecido como LeBrown) vir até o meu lugar e me arremessar em direção à auto-estrada mais próxima.

Até arrisquei simular algumas palmas, para garantir, sabe. Mas sempre olhando para os lados e tentando identificar a aproximação do LeBrown. Se eu morro aqui ninguém fica sabendo e eu tenho filha para criar. Mas não adianta dizer isso ao LeBrown, pois, o emprego dele é esse, e ele deve ter que sustentar as pequenas Lakisha, Nuala e Destiny, logo, sou apenas parte da responsabilidade dele, como pai. E eu, definitavamente, não quero atrapalhar a vida de um sujeito como o LeBrown.

Bom, ele não apareceu e, para minha sorte, o filme começou. Bem, sorte não, pois era hora de bater palma novamente.

A abertura inteira do Hulk foi uma verdadeira tortura ao som de palmas. Para que escutar a trilha sonora? A gente vai ao cinema para ouvir palmas, não é mesmo? Aí o filme começou. Mesmo. Embora lógica não se aplicasse àquelas pessoas, pensei que fosse uma regra do livreto de conduta oficial de exibições gratuitas: puxar o saco de todo mundo, afinal, se eles não tivessem feito o filme, ninguém teria comido de graça ou teria conhecido gente como Edward Norton (que o UOL conseguiu dizer que “não participou do evento”. Cuma?! É, mandaram uma jornalista até aqui, mas acho que ela esqueceu os óculos no Brasil. Hehehe).

Eu contei. Bateram palmas 12 vezes só na abertura. Começou o filme e aí ficou engraçado. Passou uma menina, genérica, nada mais que uma extra naquela montagem do início. Sem brincadeira, foi na minha frente: 7 pessoas levantaram e começaram a gritar o nome dela! Era a família!
Manja aquelas apresentações de balé que todo mundo tem que aturar só para ver sobrinha, filha, irmã ou o que for por anos a fio? Era esse o esquema! A família e amigos do pessoal vão a essas exibições, logo, fazem questão de demarcar território. Só que, em vez de mijar (nesse momento, o Word sugere que eu escreva urinar, mas só de raiva, vou manter!) no poste, eles batem palmas e bancam os joselitos.

Preciso dizer que a cada pancadaria, aparição do Hulk ou tapa que o Hulk dava no Tim Roth o pessoal batia palma? Bom, foram 7 vezes ao longo do filme. Aliás, precisei assistir de novo para descobrir a primeira frase do Tony Stark. É, as pessoas estavam batendo palmas. Ouvir o filme para que mesmo? Se alguém faz isso no Brasil, nossa versão local do LeBrown, também conhecido como Tonhão, aparece e põe pra fora. Mas ainda tem legenda para salvar, né? Aqui, se não escutou, não escutou e já era.

Fiquei imaginando como seria possível devolver minha irritação. Será que as Indústrias Stark têm algum aparelho de eletrochoque que seja acionado pelo movimento das mãos? Poderia distribuir na próxima cabine e dizer que é brinde temático, mas tinha que usar na hora! Aí, cada vez que as mãozinhas se movessem, choque neles! Radical demais? Talvez. Quer dizer, talvez naquela hora, depois eu tive certeza, pois, PODIA ser pior. Como conto a seguir. Mas o melhor acho que seria contratar o LeBrown na próxima e botar medo nos outros, não em mim.

Passado quase um mês desde o surto com O Incrível Hulk, começou o LA Film Festival. Fui cobrir por conta própria. E lá estavam as palmas de novo! Vi gente tentando bater palma em filme coreano, filme sueco e para Tropa de Elite. Bom, as platéias eram cheias de intelectualóides entusiastas, patriotas deslocados e, claro, gente esquisita. É! Além de bater palma para patrocinador de festival, alguns dormem, roncam, arrotam e peidam o filme inteiro! Uma delícia, não? Punições para esses casos também em vieram à mente, mas melhor não contar em público. Mas várias delas envolviam tortura chinesa e leve falta de oxigênio no cérebro aos sujeitos!

Dessa vez foi mais tranqüilo, sem sinal do LeBrown ou de qualquer megatime de segurança. Só umas moças distribuindo as cédulas para dar nota ao filme. Ufa, nem sinal do LeBrown, poderia exercer meu direito de não bater palmas. Acho que a Lakisha trabalhava para eles, sabe como é, a família do LeBrown é trabalhadora!

Mas o pessoal até que tentava motivar e prestigiar filmes interessantes, obras de baixo custo, cinema propriamente dito. Ok, até faz parte. Bom, fazia, até que chegou hoje com o encerramento do Festival e a exibição de Jornada ao Centro da Terra 3D!

O filme não é ruim, não entendam mal. É diversão, boas sacadas, canastrice para todo lado, mas diverte. Roteiro meio doido, mas, enfim, depois falo disso na crítica. Mas o ponto não foi esse. Foram as palmas! Claro, sempre elas. A primeira série de homenagens foi para as luzes. Luzes?
Sim, quando as luzes começaram a serem reduzidas indicando o início da sessão. Metade do cinema começou a bater palmas. Seriam os 15 minutos de atraso? Seja lá qual for o motivo, fiquei cabreiro novamente. Não tem como evitar o pensamento: vai ser a mesma pentelhação. E não deu outra. Brendan Fraser foi até o palco para anunciar o início da sessão, todo simpático e meio lesadão (novidade, né?!). Mais palmas. Bom, era o ator, vamos prestigiar. Até eu participei.

Cortina subiu, aparece o logo do Los Angeles Film Festival e… bom, preciso dizer? Tive que aturar barulho para o nome da New Line, Walden Media e para cada maldito susto que aquelas forçadas com efeitos 3D dão nas pessoas. Tipo jogar algo na direção da platéia, inserir elementos só para criar efeito e nenhum objetivo técnico ou de roteiro, enfim, tudo aquilo que o Kiss podia fazer durante a Psycho Circus Tour, mas um filme não pode! E dá-lhe palmas.

O filme acabou e aí veio meio desespero maior. 90% do público se levantou e começou a bater palmas freneticamente, gritando, gente do meu lado gritando “Watch Out Academy!”.

Nessa hora eu estava doido para o LeBrown passar por ali (vai saber, podia estar fazendo um freela para a Warner, que foi quem organizou o evento da já debandada New Line). Era só eu gritar: Lakers Sucks! E apontar pro sujeito com toda aquela cara de pau de “Foi Ele! Foi Ele! Eu juro que foi ele! Estou vestindo uma camisa do Lakers, foi ele, não eu!”

Toma cuidado, Academia??!?! O cara tinha bebido? Ele não podia estar falando sério! Aquele Oscar de Efeitos Especiais que a New Line faturou com A Bússola de Ouro foi um acidente de percurso, aliás! Foi prêmio de consolação! De qualquer forma, fiquei lá para ver até onde aquela insanidade iria. Sem brincadeira, foram 3 minutos e meio de palmas e ovação pura para uma adaptação bobinha de Júlio Verne. Como disse, não é ruim, mas apenas se salvou. Oscar? Esse povo é doido.

Na sessão de Wall-E, pelo menos, estava cheio de criança e criança não sabe o que é puxar saco, são honestas e respondem apenas rindo ou ficando quietinhas. Palmas para elas! Especialmente se o LeBrown estiver por perto!

Obrigado!

CLAP-CLAP-CLAP!

Fábio M. Barreto

Fábio M. Barreto novelista de ficção, roteirista e diretor de cinema e TV. Atuou como criador de conteúdo multimídia, mentor literário e é escritor premiado e com vários bestsellers na Amazon. Criador do podcast "Gente Que Escreve" e da plataforma EscrevaSuaHistoria.net.
Atualmente, vive em Brasília com a família.

Recomendado para você

11 Comments

  1. Hahahahaha vc me diverte Barretão, cada texto seu é um espetáculo a parte… opa antes de terminar CLAP, CLAP, CLAP, CLAP … Eu não conseguiria aturar, até hj não vi aquele filme 1408 pois quando fui ver no cinema apenas 3 pessoas não paravam de conversar e acabei saindo no inicio da sessão e pedindo meu dinheiro de volta. ops .. CLAP CLAP CLAP CLAP… Mas é isso aí né, fazer o que pela “grandeza” do evento e pelo tipo de público acabaria dando nisso, e pensar que aqui no Brasil vivo reclamando quando uma pessoa ou outra fala mais alto, sempre comento que deveria ter HeadPhone nas poltronas e tudo mais, mas CLAP CLAP CLAP CLAP , paciência.

    Abraços

    CLAP CLAP CLAP CLAP

  2. Eu nunca entendi isso de bater palma no cinema. Tipo, a coisa ta gravada, bater palma não vai mudar em nada a atuação da figura. Dependendo do filme, um momento sublime pode vir seguido de nerds vibrando ou coisa do tipo. Não me importo se for breve (eu quase levantei e bati palma quando o hulk Gritou SMAAAAAAASH!!)
    Bem, resumindo. Palmas só deveriam ser permitidas depois que uma criança o fizer.Como bem demonstrado no seu texto,eles sim entendem das coisas 😉

  3. Eu quase infartei na exibição do Hulk mas juro que não bati palmas nenhuma vez hahahahha!!

    Adorei o texto, uma crítica bem humorada e muito justa. Dependendo da situação, essa empolgação toda incomoda demais.

    E concordo em gênero, número e grau com relação à opinião das crianças, eles sim sabem o que é diversão de verdade ^_^
    O Gabriel delirou quando o Ironman apareceu na tela(sim, levamos o menino ao cinema, não tinha ninguém para cuidar dele :DDD) e eu gritei junto com ele :DDDD

    Beijos

    Sil

  4. hehehe, parabéns pelo texto, Barretão.
    Hilário, como chega a ser ridículo o comportamento da galera citada.

  5. Belo texto Barretão. =D

  6. @ Fenyang

    Cara, esse lance todo se resume a “mostrar que gostou”. Pelo menos, em tese, era nisso que eu acreditava. Até vir para cá. Palmas sempre foram um termômetro e quantas vezes a gente não lê: Clint é recebido com Palmas em Cannes, Spike Lee ovacionado em Tribeca, coisas do tipo.
    Acho que, no fundo, mais importante que as palmas, é quem bateu palmas. Dependendo do público, você tem uma razão diferente para isso. Sei lá, se você gostar muito de algo e, depois que acabar, quiser demonstrar isso, de modo real e sincero, que mal há em aplaudir? Não vejo nenhum problema, mas tudo que é demais, perde o sentido.

  7. Cara, uma vez eu estava no cinema (não lembro o que estava assistindo, mas era um filme com alto potencial nerd, tipo star wars, lord of the rings, star trek, algo assim – pra efeito de raciocinio, vamos deixar como lord of the rings) e, numa cena emocionante, um sujeito atrás de mim gritou algo como:

    – Vai, Aragorn!

    Quase saí do cinema. Faltou só o cara gritar o “pra cima deles”, “dá um carrinho no orc” ou “lança o Boromir lá na ponta, porra”. Olhei pra trás esperando ver um menino de 10 anos e tinha um cara de uns 25 anos.

    É impressionante. Será que tem gente que acha que aquilo está acontecendo de verdade? Será que algumas pessoas não sabem que aquilo é uma obra fechada, e que a participação da torcida não vai mudar o final da história.

    Vai chegar o dia (e eu sei que vai), que alguém vai vir dizer pra mim que foi assistir senhor dos anéis 19 vezes no cinema, mas não pq gostou do filme, e sim “pq nossa participação é importante nessa hora, a sociedade do anel está correndo atrás de uma vaga na libertadores, temos que ir lá apoiar!”

    ô fase de merda.

  8. “Lakisha, Nuala e Destiny”

    Haaaaaaaaaaahahahahahahahahahaha!!! Sensacional.

  9. FABIO, parabéns pelo texto e assim como você, não aturo bajuladores, ainda mais, se forem pseudo-repórteres fazendo gracinhas e bancando os “amigos” das celebridades.
    Aplausos e criticas são bem vindos, desde que sem excessos e respeitosos.
    Acredito que após ouvir tantos aplausos, o meu xará ficará algum tempo sem comparecer a aniversários…
    hehehe
    Saudações,

  10. Justamente WALL•E, o filme que deveria ser ovacionado, não recebeu essa “homenagem”.

    Ótima matéria, Barretão.

  11. […] força tanto na gíria e no perfil “downtown LA” (acho que ele é parente do LeBrown, sei não), que nem mesmo o resto do elenco entende. Jack Black é o ponto fraco. Totalmente […]

Comments are closed.